CENSURA NO BLOG



Receita de um bolo de fubá cremoso

Ingredientes

·                                 3 ovos
·                                 2 xícaras (chá) de açúcar
·                                 1 pitada de sal
·                                 4 xícaras (chá) de leite
·                                 1 xícara (chá) de fubá
·                                 1 colher (sopa) de farinha de trigo
·                                 1 xícara (chá) de queijo ralado
·                                 1 xícara (chá) de coco ralado
·                                 1 xícara (chá) de óleo
·                                 1 colher de sobremesa de fermento em pó

Modo de preparo

Bater todos os ingredientes no liquidificador.
Levar ao forno médio por 45 minutos.
 
·                                 Rendimento: 12 porções
·                                 Tempo de preparo: 30 minutos


Estranho começar uma coluna assim né? Você deve ter aberto o blog e entendido nada.

Mas acredite. Ver uma receita de culinária nas primeiras páginas dos jornais entre os anos 60 e 70 era muito normal. Acredito que boa parte da população entendesse nada quando encontrava uma receita dessas. Mas outra parte sim.

Era sinal que uma notícia fora censurada e como protesto o jornal no local que pertencia a notícia colocou uma receita. 

Não. O blog não foi censurado, quer dizer, mais ou menos no fim explico porque.

Como todos sabem durante uma parte de nossa história republicana vivemos sobre ditaduras. Seja de Getulio entre os anos 30 e 40 seja a militar entre os anos 60 e 80 e claro que com a ditadura vem a censura. As pessoas não sabem realmente o que ocorre no país.

Aí acontecem coisas como semana passada quando finalmente o governo brasileiro reconheceu o assassinato nas dependências do DOPS do jornalista Wladimir Herzog.

Artistas, intelectuais, jornalistas, políticos e pessoas comuns sofreram com a ditadura e a censura. Com a falta de liberdade para pensar. A falta de liberdade para criar.

Muitos tiveram que procurar subterfúgios para driblar a censura. Criando entrelinhas, tentando enganar de alguma forma o governo. Outros tiveram que ir para o exílio. Uma coisa incrível, ter que sair do seu país para sobreviver. Pior, muitos morreram e pior ainda alguns nunca mais a família teve notícias. Não tem corpo, não pode chorar sua morte, tem nada.   

Nem um enterro alguns puderam receber.

Ainda bem que isso acabou né?

Veja bem..Acabou mais ou menos. Realmente hoje vivemos em um regime democrático. Pessoas não são mais presas, expulsas do país, mortas ou somem porque pensam.

Mas existe uma censura sim. Existe sim uma forma de ditadura que se não é a ditadura política é uma pior. A ditadura do pensamento.

Na ditadura política a pessoa pensa e não pode falar. Na do pensamento pode falar, mas não é permitido pensar.

A imprensa brasileira é livre até a segunda página. Não é obrigada mais a colocar receitas de bolo, mas tem que seguir uma linha editorial onde não pode contrariar interesses do dono da publicação ou de anunciantes. Temos revistas e jornais de oposição, temos de situação e o mais difícil de encontrar é a livre.

Além disso temos hoje uma das piores invenções recentes da humanidade que é o “politicamente correto”. O mundo encaretou, ta chato e a impressão é que nos anos 80 era muito mais livre. Não temos mais mulheres nuas nem temas críticos no carnaval. Não pode mais fazer piada com negros, religiosos, mulheres ou gays em programas de humor. Renato Aragão e Mussum hoje seriam presos por se chamarem de “macaco” e “Paraíba”.

Pai não pode dar mais selinho no filho em público porque corre o risco de ser acusado de pedofilia. Mexem em cantigas antigas de crianças como “atirei o pau no gato”, execram Monteiro Lobato lhe chamando de racista sem tentar entender como era o mundo em sua época.   

Proibiram anúncio de cigarros na TV tornando-se babás de pessoas adultas. Bebida cada vez mais é restrita. Processam Alexandre Pires por racismo devido um clipe esquecendo qual é sua cor. Imagine se lançassem hoje “mas como a cor não pega mulata, mulata eu quero teu amor”.

Cotas de tudo. Cota racial, sexual, etc e tal só não fazem cota pra gordo me discriminando. Aliás, sou discriminado porque agora ganhamos a alcunha de “obesidade mórbida” e já cogitaram gordo ser obrigado a pagar duas cadeiras em cinema e avião.

Por falar nisso tentaram emagrecer o rei momo. Em alguns lugares ele tem que ser magro.

Não sou contra as minorias se protegerem e reivindicarem seus direitos. Sou contra perseguições. Sou contra Rafinha Bastos perdendo emprego porque fez uma piada ruim.

Sou contra lésbicas serem expulsas de restaurante por se beijarem ou casal de homens apanhar na rua simplesmente por serem gays como se a bunda ou o pênis fossem dos agressores pra se meterem assim na vida alheia.

Sou contra a Paula Fernandes, que é linda, mas pra mim canta nada, ser perseguida por evangélicos por se declarar espírita.

Sou contra perseguirem Zeca Pagodinho no youtube porque ele disse brincando que o inferno pode ser legal. O Brasil vive um momento perigoso que é a imposição religiosa. Silas Malafaia e sua turma perseguindo gays, pessoas de outra religião, conseguindo colocar um pastor homofóbico e racista pra comandar a comissão dos direitos humanos da câmara e deixando ainda mais cegas pessoas que já não enxergavam bem e usam a bíblia como se fosse uma Ak 47 fuzilando e tentando fazer a catequese do novo milênio em quem pensa diferente.

Assim como sou contra perseguirem evangélicos, que em boa parte são pessoas de bem, por causa de uns safados que usam a fé alheia pra enriquecer e ganhar poder.

Por fim. Sou contra me censurarem e o que fico mais puto é que muitas vezes fui cobrado na vida real por amigos e parceiros de samba por opiniões que dei na internet. De tal modo que ocorreu a pior censura que pode ocorrer a alguém que é a auto-censura.

É ter vontade de escrever um monte de coisas aqui nesse blog ou twitter e facebook e não poder porque posso prejudicar outras pessoas ou a mim mesmo porque tem gente que nem sempre quer receber opiniões divergentes mesmo que construtivas. Tão acostumados a adulações vêem uma crítica como forma de inimizade passível de retaliação.

E o pior de tudo é que esses amigos que tem medo de se comprometer, brigam comigo quando falo não conseguem o respeito de quem não querem enfrentar e são tratados como nada . É aquilo, quem se abaixa muito acaba mostrando a bunda.  

Então eu não estava errado no começo. Esse blog vive sob censura, eu vivo sob censura e todos nós vivemos porque a ditadura pode ter acabado, mas a liberdade de expressão ainda é restrita.

E desse modo continuamos caminhando e cantando com um pano imaginário amarrado na boca. A caneta com um nó porque escrever o que quer sempre tem seu preço e pode ser caro demais.

Façam a receita ali de cima, esse bolo de fubá é delicioso. Mas que receitas como essa continuem apenas em páginas de culinária e mesmo que a gente não consiga mudar o mundo, nossa cidade, clube de futebol ou escola de samba, mesmo que zombem ou mandem deixar pra lá o que não gostamos  que pelo menos não percamos o poder de nos indignar e revoltar. 

Se for pra acabar em samba que seja com a gente comandando a batucada.   

Bom apetite.









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